sexta-feira, 12 de junho de 2015

‘São muito mais ricos do que eu’

24 de junho de 2014

Oitavo filme de Wes Anderson (Os excêntricos Tenenbaums, Moonrise Kingdom), “O Grande Hotel Budapeste” teve estreia mundial na abertura do Festival Internacional de Cinema de Berlim 2014, quando conquistou o Urso de Prata. Foram decisivas para a feitura do roteiro as narrativas de Stefan Zweig, escritor mais lido e traduzido no mundo na primeira metade do século passado. No que se segue, Paul Katzenberger (Süddeutsche Zeitung) entrevista o cineasta quando do lançamento do filme na Alemanha. Tradução: Zé Pedro Antunes.

Seu filme festeja os velhos tempos e sugere um certo luto por eles terem passado inexoravelmente.

Quando começamos a escrever o roteiro, a ação se dava no presente. Aliás, na França e na Inglaterra, onde estávamos na época. Nisso me caíram nas mãos os livros de Stefan Zweig e comecei a devorá-los, ao reconhecer uma ligação entre o conteúdo deles e minha própria vida.

Os livros de Zweig surgiram há quase 100 anos. Que paralelos encontrou entre os primórdios do século 20 e este início de século 21?

Já o primeiro capítulo do primeiro romance dele que eu li, “Coração Impaciente”, descreve uma situação que me é familiar: Em busca de paz, um escritor conhecido vai a uma localidade fora de Viena, que acredita menos badalada do que antes. Mas logo na chegada topa com um conhecido, enfronhado nas fofocas da cidade e cioso de suas boas relações. Para não ser inamistoso, acaba se deixando envolver. Nisso, entra um notório herói de guerra, a quem o conhecido pronto volta sua atenção. Mas, visivelmente irritado, o herói lhes dá as costas.

Quase como no trato usual entre as celebridades, hoje, com os fãs ou pessoas que se fazem de importantes. No ramo cinematográfico, por exemplo.

Já vivi exatamente a mesma situação e conheço bem personagens como esses de Zweig. Quando conto uma história do passado, não me distancio de minhas próprias experiências e observações, é a mesma relação que tenho com uma história no presente.

Sobre a inspiração em filmes antigos, há alguma ligação intencional com “O Silêncio” de Ingmar Bergman? Ambos se passam num hotel, em um lugar imaginário.

Por um lado, “O Silêncio” tem ritmo bastante diferente. Por outro, vejo paralelos interessantes: O drama de Bergman também se passa num lugar fictício na Europa, no qual mesmo a língua é inventada. Estamos num grande hotel, em cujos amplos corredores esse jovem perambula. Tudo é extraordinariamente misterioso. Os corredores nós fomos buscar em “O Silêncio”. Se quiser, também a atmosfera desse clássico nos serviu de inspiração. [...]

Sobre pagar mal os atores, Bill Murray tocou no assunto durante o Festival de Berlim, achei que era piada. Mas vejo que era a sério mesmo.

Foi uma piada, mas ele tem razão. Se tivéssemos pago a todos o que normalmente recebem, não daria. Só os gastos com o pessoal consumiriam o orçamento inteiro.

Como conseguiu atrair esse elenco inacreditável?

Se eu disser que sabia exatamente como, estaria mentindo. Mas sempre ajuda dizer: “Foi o que acertamos para o último filme, e nele estão os que toparam fazê-lo.” E aí vem a reação: “Ok, se fulano fez, faço também eu”.

Curioso comportamento de manada, em pessoas que só fazem se comportar como algo muito especial. Inclusive pelos salários astronômicos.


Não dou a mínima para as finanças deles. São muito mais ricos do que eu. O primeiro que fiz nesses moldes foi “Rushmore”, com o Bill Murray. Ele acabara de ganhar 9 milhões de dólares por “O Dia da Marmota” (1993). Esse era o meu orçamento inteiro. Perguntei-lhe o que daria para fazer. Disse que ficaria satisfeito se lhe pagassem de acordo com as tarifas de ator: 9 mil dólares. Assim surgiu o meu sistema de salário mínimo. Bill Murray contribuiu substancialmente para isso, deve isso a si mesmo.



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