quarta-feira, 16 de setembro de 2015

Cinema Mudo: trilhas sonoras contemporâneas

9 de abril de 2013
por José Pedro Antunes

“Com trilha sonora contemporânea, cinema mudo tem cada vez mais espectadores”, dizia a manchete da Gazeta Russa em 25/01/2012. Na foto, a silhueta de um violonista se destaca à frente da tela onde se projeta o filme Luzes da Cidade, de 1931. O cinema é um dos mais antigos de Moscou, o “Khudojestveni”. O violonista é o jovem artista russo Arseni Trofim, a executar a trilha que compôs para o grande clássico de Charles Chaplin.


É um trabalho que ele e outros artistas desenvolvem em vários pontos do país. Para que os resultados possam ser compartilhados, músicos de Kemerovo e Tomsk criaram um festival batizado como “Tapeur” (do francês, em desuso, para se referir a quem se dedica à sonorização de um filme usando partituras já existentes). Com o objetivo de atrair o grande público para os filmes clássicos e experimentais do cinema mudo, Arseni Trofim criou o projeto “Sala Tapeur Contemporânea”.

Entre nós, alguns músicos se dedicam a criações semelhantes. O Sesc/Araraquara já promoveu uma oficina ministrada pelo compositor Lívio Tragtenberg, que resultou numa apresentação de Limite, de Mário Peixoto – trilha sonora executada com a participação de músicos locais. Um outro evento trouxe a banda “Frame Circus”, formada por Tatá Aeroplano (Cérebro Eletrônico, Jumbo Elektro), pelo compositor de trilhas sonoras Paulo Beto e por Maurício Fleury (Multiplex e Montage).


No Sesc/S. Carlos, quinta-feira última, para acompanhar Mistérios de uma Barbearia (Karl Valentin, 1922), o evento “Brecht em Cena” convidou o pianista Tony Berchmanns. As técnicas, e mesmo alguns macetes surrados, ele comentava depois da exibição, são em grande parte devedores de Richard Wagner, cujo método, pioneiro, se adequa às necessidades dos “neotapeurs”. Tivesse alcançado o cinema sonoro, o compositor certamente teria tido êxito como criador de trilhas para o cinema.



Berchmanns improvisa grande parte do que executa. Houvesse uma segunda sessão, o resultado seria outro. Mas próximo. Não há como fugir a convenções de eficácia comprovada. Como a elementar diferença entre acordes maiores (mais alegres, festivos), e acordes menores (tristes, depressivos). Ou o uso da dissonância para suscitar inquietações, gerar expectativas. E, para marcar os saltos da narrativa, acordes instigantes, bruscamente martelados no piano.

Mesmo tendo visto o filme antes, o pianista opera como um tradutor, ao perseguir, com sonoridades, ideias e sentimentos implícitos nas imagens. Mudo ou sonoro, todo filme pressupõe uma partitura. Muitos dos elementos da composição musical são os mesmos que norteiam a composição fílmica.

No conceito de “leitmotiv” (motivo condutor), que vem justamente de Wagner, temos um substantivo derivado do verbo latino que nos deu “mover” (filme, em inglês, se diz “movie”), acoplado ao radical do verbo alemão “leiten”, que significa “conduzir” (também usado no âmbito da música) ou “dirigir” (de amplo uso tanto na música como no cinema).

Já a caminho do cinema sonoro, para se distanciar da literatura e do teatro, alguns cineastas buscaram a proximidade da música. Em 1927, o alemão Walter Ruttmann rodou Berlim: Sinfonia da Metrópole – um dia na vida da cidade, com o amanhecer, o dia pleno, o anoitecer e a vida noturna sendo os movimentos de uma composição de Edmund Meisel.




Foi a matriz de um gênero, o “filme-sinfonia”, que gerou sucedâneos. Em 1929, surgia São Paulo: Sinfonia da Metrópole, de Adalberto Kemeny e Rudolf Rex Lustig, dois jovens de origem húngara, que na época eram donos dos melhores laboratórios do país. Mostravam uma cidade que deixava de ser mero entreposto comercial para se tornar o maior centro financeiro do país. Em tempo: o filme alemão foi lançado em DVD pela Continental, enquanto a película brasileira, além de se oferecer na net como DVD “raro”, também está disponível no YouTube.





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